Muito tem sido dito acerca dos prejuízos decorrentes dos mais de dois anos de isolamento social, afastamento de afetos e da interrupção das trocas sociais e culturais provocadas pela pandemia. Não nos esqueçamos, claro, do tempo em que também nossa universidade teve seus trabalhos presenciais suspensos, período em que os debates acalorados e as demandas científicas ficaram um tanto ao lado diante de urgências tais como continuar vivendo, mantermo-nos vivos e encontrarmos – na USP, na família e na vida – todos aqueles de quem gostamos, vivos e bem, num futuro que não sabíamos ao certo quando e se chegaria.
Entretanto, a nossa universidade é feita de uma matéria que nunca para: cérebros, cabeças que geram ciência, cabeças que geram conhecimento, cultura e também arte. E como nossas cabeças não se cansam de criar, temos na edição 2022 do Programa Nascente cerca de 896 obras inscritas, que redundam da participação de 655 alunes e pesquisadores vinculados aos nossos 6 campi e às mais diversas áreas do saber.
Com esse significativo número de participações, saudamos não só a Criatividade que sustenta a nossa universidade, como também a Vida que continua brotando em cada poema, em cada canção, em cada obra de arte e de designe e em cada grão de voz participante dessa edição.
Sobretudo, saudamos as pessoas – participantes, jurados, público expectador, esperando que essa edição inaugure novos tempos, iluminados pelo sol de um novo dia.
Saudações Acadêmicas,
Creio que não seria exagero dizer que, mais do que um projeto cultural, o Nascente foi a realização de um sonho: fazer com que a Universidade pudesse tornar visível aquilo que, em sete áreas artísticas, fazem os seus estudantes.
Um sonho bonito que se opõe às imagens de pesadelo com que a Universidade, no Brasil de hoje, tem que se haver em seus momentos de vigília. Pesadelos que se traduzem pela inércia, o descaso, a entrega à rotina paralisante, o pessimismo, a descrença. Contra tudo isso, sonhou – se o Projeto Nascente.
Uma demonstração inequívoca de vitalidade, de criatividade, de que a Universidade é mais do que dizem as vozes da burocracia que não acreditam na cultura porque somente entoam a mesmice e o conformismo. Esta exposição, organizada pelo MAC, começa a tornar público os resultados obtidos e mais real aquilo que, sonhado pelos artistas, fez parte do sonho do Nascente.
Foi pensando em incentivar o fazer artístico entre seus alunos que a Universidade de São Paulo desenvolveu o Programa Nascente. Ele é uma iniciativa da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária e destina-se a revelar novos talentos artísticos por meio de um concurso aberto aos alunos de graduação e de pós-graduação da USP, incluindo os estudantes da Escola de Arte Dramática da ECA.
Criado em 1990, o Programa Nascente tem o intuito de mapear e estimular a produção cultural dos alunos da USP, premiando o fazer artístico no âmbito da graduação e da pós-graduação. Foi idealizado na gestão do professor João Alexandre Barbosa, com inspiração da professora Ana Mae Barbosa, então diretora do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP.
“Mas eu tinha que criar projetos novos, e eu criei aquele que até hoje é a minha menina dos olhos, o Projeto Nascente, que nasceu de um desafio que um estudante fez numa reunião do Conselho de Cultura e Extensão. Ele me disse que a Universidade nunca havia ajudado os alunos que tivessem algum dom artístico, ao que respondi que ele tinha razão, e que nós íamos mudar isso.”
O criador do Nascente USP, Professor João Alexandre Barbosa
Em abril de 2011, a jornalista Patrícia Ogando, do Jornal do Campus, realizou uma matéria sobre a visibilidade e promoção que o concurso artístico da USP proporciona e entrevistou artistas hoje consagrados.
Transcrevemos abaixo:
Um ganhou o Prêmio Jabuti de Romance e Livro do Ano, o outro já atuou em filmes como “Meu nome não é Johnny” e “Carandiru”. Eles são José Roberto Torero e Luís Miranda, ex-alunos da USP e vencedores das primeiras edições do Programa Nascente da Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária da USP (PRCEU). Criado com o objetivo de identificar e estimular alunos que se destacam no fazer artístico, o programa Nascente está com as inscrições abertas para a 19ª edição até dia 20 de abril.
Esses nomes exemplificam o sucesso relativo do programa. Torero, que estudou Jornalismo e Letras na USP, venceu a segunda edição do Nascente com o esboço de Galantes Memórias e Admiráveis Aventuras do Virtuoso Conselheiro Gomes, o Chalaça, livro que ganharia em 1995 o mais importante prêmio de Literatura do país, o Jabuti. Já Luís Miranda era da Escola de Arte Dramática da ECA e venceu a primeira edição, em 1990, com o espetáculo de dança Eguns. Na época, Luís ganhou o equivalente a cinco mil dólares.
Para o ator, o prêmio foi imprescindível em termos econômicos e o ajudou a ganhar projeção. “Imagina: ‘cruspiano’, vindo de Salvador, duro que nem um cão. Esse dinheiro veio a calhar. Foi um prêmio que me deu certa visibilidade. Um ator que dança, que ganhou um prêmio de coreografia. Isso foi muito bacana”, diz.
O Nascente USP , por meio de sua premiação anual, procura reconhecer atores, poetas, músicos, pintores, diretores, escritores, compositores, designers, escultores ou cineastas de grande qualidade no universo de jovens que diariamente circulam pelos vários institutos e faculdades da Universidade.
O Nascente USP , por meio de sua premiação anual, procura reconhecer atores, poetas, músicos, pintores, diretores, escritores, compositores, designers, escultores ou cineastas de grande qualidade no universo de jovens que diariamente circulam pelos vários institutos e faculdades da Universidade.
Em 2018 o Concurso passou por uma reformulação de identidade tendo seu nome mudado para Nascente USP, o que sugere uma conexão mais direta com seu público. Atualmente, o novo coordenador acadêmico do Nascente USP é o professor da área de Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa da FFLCH, Emerson Inácio.
Assim, o Nascente continua e aprofunda sua atuação, com o objetivo de aproximar a comunidade universitária do fazer artístico de qualidade, estimulando a reflexão sobre a arte e a cultura como valores inexoráveis na formação do indivíduo, da sociedade e da humanidade.
É claro que eu já sabia bem quem era João Alexandre Barbosa.
Não só pela sua obra como, também, de tanto ouvir Walnice Nogueira Galvão falar nele.
Bem, muito bem, é óbvio.
Quem nos aproximou foi Aloísio Falcão, outra excelente figura. Eu tinha acabado de assumir o pomposo posto de diretor editorial das revistas masculinas da Editora Abril e tinha umas ideias malucas sobre a revista Superinteressante que estava sob o mesmo chapéu.
E pedi uma conversa com o professor, na Edusp.
Inesquecível conversa.
Ele e seu inseparável cachimbo me ouviram com a devida atenção.
Mas o que eu ouviria dele era muito mais interessante que a minha preocupação com a Super.
João Alexandre tinha um projeto e buscava quem o respaldasse.
Ninguém melhor que a Abril para tanto, supunha.
Com razão, para variar.
O projeto tinha nome e nem precisava de sobrenome: Nascente.
“Cadê o seu talento?”, perguntava o projeto aos alunos da USP, na busca de vocações artísticas, literárias, enfim, na procura de revelar talentos estivessem onde estivessem.
Quem poderia garantir que não existia um grande cantor de ópera na Faculdade de Física, por exemplo?
Ou um refinado escritor na Engenharia?
Quem sabe até um violinista na Faculdade de Educação Física e Esportes.
Ele descrevia o projeto e seus olhos brilhavam como os de uma criança diante de um caleidoscópio.
Aquilo me comoveu.
Voltei para a Abril certo de que não poderia falhar na empreitada de convencer meus chefes de que aquele era um projeto que tinha tudo a ver com a editora, uma magnífica maneira de criar um vínculo criativo com o maior centro de excelência do país.
E a ideia de João Alexandre era tão boa que nem precisei gastar muito de meu inexistente poder de venda.
Muito embora a única condição que ele tinha imposto fosse, com toda razão, que não poderia haver nenhuma ingerência direta da Abril na organização e nos critérios de avaliação do Nascente, a editora topou bancá-la simplesmente com a menção de seu nome associado ao projeto.
E nasceu o Nascente, em 1990, para virar a menina dos olhos do professor.
Quando alguém me pergunta das coisas que me orgulho de ter participado, o Projeto Nascente tem um lugar especial.
Menos, admito, pelo projeto em si que, sejamos razoáveis, era todo de João Alexandre.
Mais por ter podido, durante quase cinco anos, ver de perto o brilho dos olhos de menino do velho, e querido, e saudoso, professor.